Era uma vez uma terra, lá nas bandas do Oriente... Nessa terra, o sol demorava muito a chegar e também demorava muito a partir... Era uma terra privilegiada, onde existiam as mais belas flores e os mais saborosos frutos, inúmeros rios e árvores especiais. Essa terra ficava entre dois rios. Um corria para o norte, e a água era fria; o outro corria para o sul e a água era quente. Dessas águas quentes, um dia se espalhou um povo pelo mundo. E isso aconteceu por conta de uma perseguição... Havia um rei chamado Quivir, que tinha uma tropa dos mais destemidos e valentes beduínos do mundo... Ele não era um mau-rei, mas um pouco egocêntrico demais, por vezes se perdia em seu orgulho. Um dia, esse rei foi acometido por uma dor-de-cabeça fortíssima. Parecia que iam romper os nervos, a dor era lancinante, e persistia por vários dias... Os magos foram consultados, bem como os curandeiros do país. O rei ofereceu suntuosa quantia para quem lhe livrasse de tão nefasto mal que punha em risco o seu cargo de dirigente do país. Todos os magos eram unânimes em afirmar que a doença misteriosa do rei não tinha cura. E o tempo passava... Um mago ambicioso, ao saber da recompensa, resolveu agir... Seus olhos brilhavam cobiçosos quando, depois de examinar cuidadosamente o rei, sentenciou:
- Majestade! Já sei o motivo de tal dor! O que a causa, e qual a solução. Permita-me dizer, ó senhor de todas as coisas! - sua atitude falsa não foi percebida pelo aflito rei, nem pela sua corte de magos.
- Dize! Reafirmo que te recompensarei regiamente se me disseres! - ele estava desesperado.
- O que causa sua infinita dor, ó Rei, é uma víbora que se alojou em sua cabeça! Trata-se de um gênio mau, que tomou a forma ofídia para causar-lhe transtornos! E não há como livrá-lo de tão nefasta presença! - o mago falava com entonação profética.
- O que farei, mago? Saberias me dizer como domar esse gênio das trevas?
- Essa serpente se acalmará se, todas as semanas, o senhor beber o sangue do homem mais forte e mais inteligente desse país, e comer o coração da jovem mais formosa e mais cheia de graça! Somente através desse sacrifício será possível aliviar suas dores!
O rei era muito desconfiado, e, da mesma forma como todos os magos, que já estavam invejosos e irritados com o rival, não acreditou direito nisso e disse que só pagaria a recompensa se sentisse uma melhora na terceira semana. O mago concordou, e assim foi feito. A notícia se espalhou rapidamente, e uma macabra eleição foi feita para que se decidisse quem era o guerreiro mais forte e mais destemido, e quem era a beldade que o acompanharia ao sacrifício que devolveria a saúde do insano rei. Sabe-se lá como, depois do bizarro ritual, as dores do rei cessaram, e todas as semanas um casal era sacrificado. Os pais escondiam seus filhos, mandavam-nos para longe, na tentativa de fugir de tão desumana tirania. Com o tempo, as pessoas que estavam na mira dessa situação não se conformavam em ter uma morte tão indigna e tão estúpida. Fugiam dessa terra abençoada... Uns iam para a região da neve, subindo. E outros, desciam para as regiões de deserto, ao sul... E com o tempo, iam se encontrando e formando grupos, era a elite daquela terra abençoada, mas estragada por um mau rei... Esses grupos eram a nata, formado pelos homens mais valentes e mais inteligentes, e pelas mulheres mais encantadoras... Seguindo e viajando, sempre fugindo de Quivir, e esses fugitivos deram origem aos povos ciganos, que, como se dizia na Pérsia Antiga, eram os bactiares, cujo nome significa: "os que buscam a sorte"...